sábado, 19 de fevereiro de 2011

M.Mãe - M.Tes. - CAP.II - A Família - Consequência da Escolha

CONSEQUÊNCIA DA ESCOLHA

 
   Lembra-se que em capítulo anterior, eu escrevi que a mamãe era chamada com desdém de “para choca”? Também lhe diziam “faltar parafuso”? O amigo se recorda? Pois bem, não pensem os senhores que este teve fim. Não foi assim, até por parte de amigos, ainda hoje ouço recriminações a vida, ou ao modo de ser de minha mãe.
   No momento em que a mamãe escolhera o caminho da Igreja e trocara os passeios e as sessões cinematográficas pelos cultos, tornou-se “persona nom grata” entre alguns da família. Agora ela era motivo de recriminações e desprezo e podia ouvir com freqüência: “a Elza é uma tonta” ou, a “Elza tem um parafuso solto”, e assim por diante. Isto nunca parou. Nos últimos anos de vida dela, sua irmã, a tia Ondina ainda dizia irritada “a Elza é uma tonta”. Quantas vezes eu ouvi-a gritar com a minha mãe e frizar a sua famosa frase: “Você é uma tonta”! Em festas entre a família todos podiam tudo, menos a Elza. No casamento de uma das minhas primas quando a minha tia disse para que pegassem as famosas balinhas de côco, várias pessoas foram até a mesa com esse fim e estavam pegando o que desejavam. A mamãe também foi. Aí eu pude observar do meu lugar, a sua irmã lhe chamar a atenção por que estava pegando as tais balinhas de côco. Então eu me dirigi a tia Julia que estava sentada perto de nós e disse:
─Tia, olha lá. A senhora está vendo, tia? É por isso que a mamãe não mora perto da família...
─É mesmo, Ilaíde... Respondeu a tia Júlia.
Nesta ocasião a mamãe estava com mais de 60 anos de idade!
         Bom, isto sempre foi assim. Quando eu estava com 6 anos de idade, em 1956, a mamãe cantava no coral da IPI de Santa Cruz do Rio Pardo – SP, ela participava do contralto (segunda voz). Para aprender bem sua parte, estudava em casa com o seu bandolim. Certo dia uma de suas primas, ao ouvi-la, comentou com alguém: “a Elza tem um parafuso a menos”...
          Outro fato que me marcou profundamente, foi aos meus 9 anos de idade quando a vovozinha (bisavó) faleceu. Era o dia 9 de janeiro de 1959, enquanto se fazia o velório na casa dela, mamãe e eu voltamos em casa, já era noite, não sei porque fomos até a varanda da cozinha onde existia uma mesa, então a mamãe parou ali, segurou na ponta dessa mesa, por alguns minutos e de repente soltou um grito e caiu sem sentidos. Eu levei tremendo susto e debrucei-me sobre ela, chorando. Vieram, alguns da família que estavam em casa, dentre eles, o irmão mais velho da mamãe. Com certa rudez, ordenou-me que me afastasse e completou:

      ─ O que a Elza está precisando é de uns tapas...

Novamente a história do “parafuso a menos” tomou conta das conversinhas e bochichos entre os familiares. Como tudo isso me doía! Eu era apenas uma criança, mas sentia minha alma chorar pelo trato que o meu tesouro recebia daqueles que deveriam correr por ela, que deveriam defendê-la dos maus tratos e das ofensas, mas não foi assim! Tais tratamentos doíam no mais profundo do meu coração. Ninguém mais do que eu sabia o quanto ela era meiga, amorosa, e sensível. Ninguém mais do que eu sabia o quanto tudo isso lhe feria...
   Se com esta idade ela era tratada assim, imaginem como era quando ela era jovenzinha...Por causa das incompreensões e do clima de hostilidade, a mamãe resolveu sair da casa de seus pais. Com pouca idade ela se viu sozinha a procura de uma vida sem tantas recriminações e uma vida feliz no caminho em que escolhera.


  NA ROÇA DE ALGODÃO

Não sei dizer qual era a sua idade nesse tempo, nunca tive a curiosidade de lhe perguntar e agora, já não tenho mais oportunidade...
Ela foi morar e trabalhar na fazenda de algodão da família Sato, uma família de japoneses, muito bondosos. Lá ela encontrou amizade, carinho e compreensão. Eles valorizavam-na muito e ela se sentia feliz. Lá havia uma garotinha, filha dos patrões, de nome Kasió que já trabalhava para ajudar os pais. Com apenas 5 anos de idade, ela levantava cedo para ajudar na cozinha. Admirada com a dedicação de uma criança com tão pouca idade, a mamãe resolveu lutar ao seu lado cozinhando para peões da fazenda. Agora a Kasió ganhou uma grande aliada – a “Euza” – como lhe chamavam os japoneses. Aí a mamãe aprendeu falar algumas palavras em japonês, fazer algumas saladas e doces japoneses. Também ajudava na colheita do algodão, junto com os peões e era muito respeitada por todos.
Ela sempre se referiu a esta família com muitas saudades e carinho, sua vontade era um dia voltar a vê-los...


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