quinta-feira, 17 de novembro de 2011

M.Mãe - M.Tes. - CAP.IX – ..... - SÓ DEUS NÃO FALTOU

CORAÇÃO GRANDE

Um dia a nossa Oficial Dirigente (nomenclatura dada aos Pastores do Exército de Salvação quando estão a frente de uma de nossas Igrejas)chegou para minha mãe e pediu que ela ajudasse uma família em situação precária.   Era um casal com sua filha adolescente. Ele, o pai, havia sofrido AVC (derrame cerebral) e estava paralisado no seu lado esquerdo, acamado, e creio que o lado direito também estava um pouco afetado.   A família morava  em um lugar muito perigoso, a margem da estrada de rodagem, que denominávamos de Contorno, pois contornava a cidade para dar acesso a Rodovia que seguiria para o norte do Estado.  Ali expostos a ação de marginais, corriam grande perigo.   A mamãe permitiu que eles viessem morar conosco.  Vou chamar de ‘família Santos’, ele de seu João, a esposa de dona Elvira e a filha de Ana.  Ana era um ano mais velha do que eu, ela estava com 12 ou 13 anos.  Vejam portanto, que eu estou usando aqui nomes fictícios.  Desde então começamos ajudar a cuidar do seu João. Quando a Ana e eu ficávamos sozinhas em casa precisávamos atender o seu João, e então eu ajudava a Ana, erguê-lo para sentar-se na cama, e outras ajudas que fosse necessário.   Tinha prazer em poder ajudar, ainda mais quando estávamos sozinhas. Lembro-me do carinho que a mamãe dava a esta família, tanto que o seu João, mesmo doente como estava, sabia reconhecer. Com muita dificuldade de falar, mal balbuciava algumas silabas, contudo tentava chamar a minha mãe de madrinha.  Falava embrulhado, mas dava para entender .  Não me lembro quanto tempo durou esta situação. 
Certa noite, a dona Elvira veio aflita ao nosso quarto chamar pela mamãe porque o seu João estava chamando.   Ao chegar a beira do leito, ele balbuciou algo, que elas entenderam que ele pedia que a mamãe orasse por ele.  Mediante a confirmação por parte dele, a mamãe orou ao Senhor, entendendo que havia chegado o momento fatal.  Quando ela terminou de orar, ele deu a entender que ouvira a oração e partiu para os braços de nosso Senhor.  A mamãe ajudou em tudo que pôde. Fizemos o velório em casa.  As duas, mãe e filha,  ficaram morando conosco por mais algum tempo.  No principio de 1962, como fazíamos todos os anos, a mamãe eu fomos Santa Cruz do Rio Pardo, passar o ano novo e as nossas férias e ficamos 2 meses na casa de meus avós.   A dona Elvira e sua filha ficaram cuidando de nossa casa.

DESILUSÃO E CALUNIAS

Enquanto descansávamos em Santa Cruz, a dona Elvira em Ponta Grossa, preparava para a mamãe, o pagamento por todo o beneficio que recebera.  Preparou a retribuição por todo o carinho recebido, pela acolhida, pela confiança depositada.... Quando retornamos a Ponta Grossa, em dois dis elas se mudaram de nossa casa.  A mamãe estranhou esta atitude.  Não demorou para que soubesse os motivos de tal atitude. Quando a mamãe saía à rua, ouvia história terríveis por pessoas  que ela nunca vira antes.  Fomos a casa da vó Francisca e aquela noite pernoitamos com ela e no dia seguinte a mamãe  foi ajudar na limpeza da casa.  Pegou uma vassoura e estava varrendo os cômodos todos quando chegou perto da porta do quarto em que se hospedava uma senhora, desconhecida para nós.  Esta hospede da vó Francisca, se pôs a porta de seu quarto e com os braços abertos apoiando as mãos nos umbrais da porta, fechando desta forma a passagem, disse para a mamãe:
- Aqui a senhora não entra.
Que estranho essa atitude desta  desconhecida... “Bem” pensou a mamãe, “melhor para mim, um cômodo a menos”. E então disse para tal senhora o que havia pensado. Quando viemos embora para a nossa casa, a tal hospede virou para a vó Francisca, e quis cobrar da vó, o que ela falava sobre a mamãe:
-É essa a tal “nhá Erza” que a senhora tanto fala?! Então a senhora não sabe quem ela é?!! ....e completou falando horrores contra a mamãe e a nossa moral.   A vó Francisca ficou tão zangada com a sua hospede que a mandou embora e nunca mais vimos tal pessoa.
Também a mamãe encontrou-se com Éclair, uma jovenzinha de 14 anos, filha da tia Esbelta (mais uma de minhas tias de consideração),  que a chamava de tia e lhe tomava a benção todas as vezes que a encontrava, que lhe disse:
- Tia, aquela mulher que mora na sua casa, não presta!
- Por que, Clara? Perguntou a mamãe, e ela respondeu:
- Porque ela falou muito mal da senhora e da Tide.  Ela falou......   Assim a Clara contou tudo o que a dona Elvira falara e como ela fazia para convencer as pessoas que estava falando a verdade.  Ela convidava as pessoas para a seguirem até a nossa casa para mostrar com gestos, o quanto nós duas éramos de baixo caráter, e adúlteras.  Ainda para não ficar dúvidas de suas ‘verdades’, ela completava:
- Para provar que falo a verdade, elas chegam num dia e em dois dias eu me mudo daqui.
O pagamento por ajudar a família Santos, chegou, muito amargo e apimentado.....!



TRISTEZA E ENFERMIDADE


Havia em Ponta Grossa, um rapaz que conhecíamos desde menino. Ele era neto da vó Conceição, que já me referi anteriormente.  Ele sempre vinha nos visitar, seu nome, Nelson Kovalic.  Enfermeiro, como era, foi a pessoa certa naquele momento crítico.  Sabendo que já havíamos voltado de nossa viagem, veio naquele final de dia, para nos fazer a sua visita amiga.  Então a mamãe começou a abrir seu coração e contar para ele, toda a história, e começou a chorar muito.   Nesse momento de grande tristeza em que a desilusão tomara conta, em seu estado nervoso, a mamãe ia perdendo os sentidos num desmaio que comprometeria para sempre o seu estado de saúde. Prontamente o Nelson a socorreu, não permitindo que isto acontecesse.  Desse momento em diante ela ficou acamada.  Durante a semana seguinte ficou em estado dormente, com os olhos semicerrados e ao todo ficou acamada por 2 meses.   Nesse ínterim, o Nelson trouxe um médico para consultá-la, o doutor Russo, que dentre os medicamentos que receitou, havia um que sería endovenoso, vitamina para os nervos, que se chamava ‘Succil B12’. Durante esse tempo de enfermidade, todas as nossas finanças, que já eram escassas, se foram e não tínhamos aonde correr.   Todas as freguesas que deviam para a minha mãe, nos pagaram e agora nada mais tínhamos para receber....
Eu fui a Farmácia, no centro da cidade, para saber o preço de tal medicamento = cada ampola custava Cr$ 2,00 (dois cruzeiros).  Para que o amigo tenha idéia do valor proporcional, vale aqui dizer que quando a mamãe, ainda em recuperação, começou a trabalhar no Hospital São Lucas de Ponta Grossa – PR, seu salário era Cr$ 4,00 (quatro cruzeiros) por mês.   Ela precisava tomar varias ampolas deste medicamento, mas..., como? De que maneira iríamos conseguir adquirir tal remédio, se não tínhamos dinheiro, nem para uma ampola?  Quando ela pôde, escreveu aos seus pais em Santa Cruz do Rio Pardo – SP,  e o seu irmão, o Ittai, que trabalhava na área da Saúde Pública, conseguiu uma caixinha quadrada (embalagem de giz escolar, de 12 x 12  x 12 cm de tamanho, mais ou menos), cheia com as tão necessárias ampolas, de Succil B12. Era o suficiente para que ela se restabelecesse. 
Louvo a Deus por ter guardado a mamãe naquele dia, fazendo com que o Nelson lhe assistisse, evitando que ela perdesse os sentidos.   Este ato evitou um mal maior.  Se não fosse o pronto atendimento do Nelson, três seriam os resultados possíveis: ou ela teria morrido, ou teria ficado paralítica para o resto de sua vida, ou teria enlouquecido.  Não sei qual o nome da sua enfermidade, o que se comentou foi que ela fora acometida por 5 doenças nervosas, sendo que uma delas atingiu o neurônio.

SÓ DEUS NÃO FALTOU


Eu fazia tudo que eu podia pela mamãe.  Foram dois meses terríveis, meses que prenderam a mamãe no leito.  Durante esse tempo eu cozinhava, com dificuldade, porque todas as coisas foram acabando.  Quando conseguíamos um pouco de fubá, eu procurava fazer um angú, mal temperado e mal cozido. 
 Por que mal cozido?
Nós não tínhamos fogão a gás, o nosso fogão era de lenha, porém muito ruim. Ele já havia sofrido a queda de 2 raios em anos distantes, e nunca foi corrigido, então para se fazer fogo era muito difícil, mais fazia fumaça do que realmente, fogo. E, diga-se de passagem, eu era uma péssima foguista, e ainda sou.  Aí a panela se escondia entre a fumaça. Agora imagine uma comida feita dessa forma e mal temperada... Alguns vizinhos, de vez em quando me chamavam, para nos dar uma travessa do que sobrou no domingo: como era gostoso!
Outras vezes saia a catar na beira da mata vizinha, alguma verdura comestível, o que era acrescentado à sopinha que eu estava a preparar.  Leite e carne eram alimentos de luxo e levava quase o ano todo para que nós pudéssemos comprar estes tão almejados e necessários alimentos.
Um dia, nada mais tínhamos para cozer e eu precisava dar o que comer para a mamãe que estava doente.    Havia um pouco de farinha de trigo.  Então decidi fazer uma sopa de trigo.  Se esta sopa for bem feita, fica muito gostosa.  Para que ela fique saborosa temperamos a água com o que desejamos para que se faça um deliciosa sopa.   Em um prato ou tigela pomos a farinha de trigo a gosto (aproximadamente 1 e ½ xícara) e acrescentamos ovos inteiros e temperos com sabores, a gosto.  Então, mistura-se tudo até que dissolva bem a farinha de trigo. A massa deve ficar bem pastosa, como um mingau bem grosso, ao ponto de pingar bolas da colher.  Não fazer bolas muito grandes, apenas a ponta colher, como se fosse fazer uns bolinhos fritos (bolinhos de chuva).  Quando o caldo estiver fervendo, não apenas fazendo bolinhas, mas pulando mesmo, então com a colher vai pingando esse massa na fervura.  A medida que vai caindo as bolinhas de trigo na panela, elas vão cozinhando, no final fica semelhante a inhoque.   Fica muito saborosa. 
Pois bem, eu queria fazer essa sopa para a minha mãe, mas não tinha temperos, ovos, ou outra mistura qualquer. Só tínhamos sal, e um pouco de banha de porco.
Coloquei a panela no ‘fogo’. Temperei a água e esperei ferver, mas nunca fervia.... Preparei a mistura, ou melhor, o ‘mingau’ com toda a farinha de trigo que tínhamos em casa temperada apenas com sal.   Quando a água resolveu ferver comecei a pingar a mistura na panela, contudo a ela parou de ferver, e o fogo....bom o fogo, como já disse anteriormente, era só fumaça. Ao fim de tudo, saiu uma gororoba que mais parecia um mingau embolotado do que uma sopa de trigo.  Quando o caldo não está fervendo bem, ao adicionar os pingos da mistura de farinha de trigo, eles se dissolvem parcialmente formando um mingau mal feito.
Depois de tudo, o que eu fiz, deu apenas um prato de sopa, que eu levei para minha mãezinha, na cama, com muito prazer, o que ela saboreou como se fosse a melhor sopa que já havia deglutido.  Dizia estar saborosa.   Eu fiquei encostada a porta do quarto vendo-a se alimentar, satisfeita porque ela podia comer.  Quando ela estava terminando de saborear aquela gororoba que fiz, olhando para mim, lembrou-se então de me perguntar se tinha sobrado para mim. Não, não havia sobrado nada. Só consegui fazer aquele prato de comida e não havia mais nada para cozinhar.  Ela ficou triste porem não me lembro que eu senti fome.   Deus me sustentava. 
Em casa nos faltava tudo, só Deus não nos faltava.  Ele sempre cuidou de nós e nunca deixou que passássemos o dia em jejum, sem ter alguma coisa para comer.
 “Não fosse o Senhor, que esteve ao nosso lado, Israel que o diga; não fosse o Senhor que esteve ao nosso lado quando os homens se levantaram contra nós, e nos teriam engolidos vivos, quando a sua ira se acendeu  contra nós; as águas  nos teriam submergido, e sobre a nossa alma  teria passado a torrente; águas impetuosas teriam passado sobre a nossa alma.  Bendito o Senhor, que não nos deu por  presa dos dentes deles.  Salvou-se a nossa alma, como um pássaro do laço dos passarinheiros; quebrou-se o laço, e nós nos vimos livres.  O nosso socorro está em o nome do Senhor, criador do céu e da terra.” (Salmo 124:1 a 8)
A Palavra de Deus é fiel.  O Senhor não permite  que as provações sejam maiores do que  as nossas forças.  O Senhor põe limite para as provações que vem sobre nós.  Aqui também Ele cuidou de nós e não permitiu que a nossa alma fosse atingida.  Se você ler a história de Jô, verá que  satanás pede oportunidade de nos provar e Deus, ao permitir, lhe dá limites intransponíveis.  “Disse o Senhor a satanás: eis que tudo quanto ele tem está em teu poder: somente contra ele não estendas a tua mão.”(Jó 1:12) Depois de destruir tudo que Jó possuía, tirar a vida de seus filhos no mesmo dia, não satisfeito, satanás queria mais, queria que Jó blasfemasse contra o Senhor Deus, então retornou a presença do Senhor e pediu mais:  “Então, satanás respondeu ao Senhor: Pele por pele, e tudo quanto o homem tem dará pela sua vida.  Disse o Senhor a satanás: Eis que ele está em teu poder; poupa-lhe a vida.” (Jó 2: 4 e 6) E se você desejar saber mais sobre a história de Jó, verá como ele sofreu  com tumores malignos e fétidos.  Contudo não blasfemou.  Sofreu muito, mas o Senhor ao fim de tudo devolveu-lhe em dobro tudo que possuía antes de sua tão grande provação.  “Sê fiel até a morte e...” (Apocalipse 2:10b ) Devemos ser fiéis ao Senhor.  Os homens só nos ferirão, mas o Senhor nos curará.  “Sê fiel” é a ordem do Senhor e é o que interessa.  A mamãe  e eu sofremos muito, as duras provações  mas o Senhor nunca nos abandonou.   Se passámos por isso, foi porque o Senhor achou que podíamos suportar.
Deus é fiel! Ele nunca nos faltou!!! 

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